A pesquisa em ciências humanas não pode ser vista como a “gata borralheira” da ciência!

As reivindicações vêm de longa data e, certamente, não estamos constatando uma novidade: as Humanidades são objeto de preconceitos, desconfianças e desrespeito por parte de um conjunto significativo de pesquisadores e órgãos de financiamento em C&T&I. Para eles, não há dúvida: elas ocupam um patamar inferior no universo da ciência.
Muitos “estudiosos” justificam esta condição, argumentando que as métricas ou indicadores de avaliação que contemplam essa área são pouco precisas, que as teorias que as fundamentam são frágeis e que, em boa parte dos casos, sua contribuição para o conhecimento científico é discutível. As Humanidades, segundo este grupo, certamente equivocado, não passam de narrativas vazias, não consistentes, que alimentam interpretações não comprovadas e a difusão de ideologias.
A esses argumentos se somam outros mais contundentes, como o de que a pesquisa em ciências humanas não tem impacto científico internacional e não se traduz em soluções para problemas concretos.
É necessário questionar estas justificativas que contribuem para relegar as ciências humanas a um segundo plano, sobretudo porque as ciências humanas, as ciências sociais aplicadas, que incluem a Comunicação, a Sociologia, a Antropologia, a Educação, a Linguística, a Ciência Política, dentre muitas outras, desempenham papel fundamental no contexto da ciência e da sociedade. Elas incorporam e estimulam uma visão crítica do progresso técnico e científico, que, repetidamente, favorece os grandes interesses e as companhias globais.
Não tem sido, necessariamente, as disciplinas científicas, localizadas nas áreas das Ciências Físicas e Matemáticas, das Ciências Biológicas ou da Saúde que investigam e promovem, prioritariamente, o debate sobre as desigualdades sociais profundas em nossa realidade, sobre a ameaça à sobrevivência das comunidades tradicionais (quilombolas e indígenas), sobre a importância da comunicação popular e comunitária ou mesmo sobre o papel da divulgação científica e o Jornalismo Científico para a promoção da inclusão social.
A distribuição de recursos de boa parte (não seria a da totalidade?) dos órgãos de financiamento das pesquisas penaliza, sempre, as ciências humanas, assim como privilegia o agronegócio exportador e discrimina a agricultura familiar, incentiva o incremento do uso da IA, mas dá menos atenção ao impacto ético de suas aplicações e por aí vai.
Evidentemente, as prioridades de pesquisa dependem dos governantes e dos gestores principais dos ministérios da educação e de ciência e tecnologia e dos órgãos de financiamento, como a Capes, o CNPq e as Faps (Fundações de Amparo a Pesquisa) dos diversos estados da Federação. Mas há abusos na definição dos investimentos em pesquisa.
É preciso mudar os conceitos, as percepções enraizadas sobre a importância das várias áreas de conhecimento, o que significa priorizar, certamente, as que são importantes para o desenvolvimento do país, mas também reconhecer que existe vida fora das ciências físicas e matemáticas, biológicas e da saúde.
Os projetos e os pesquisadores competentes das Ciências Humanas merecem respeito e apoio. Ignorá-los ou relegá-los a um patamar inferior, colocando-os no mesmo nível dos “picaretas” que cultivam as chamadas pseudociências, constitui um equívoco formidável. Os que insistem nisso afrontam a razão, contrariam a verdadeira ciência, e apenas consolidam privilégios e interesses que mantêm o status quo. Já passou da hora de mudar este cenário. Ou não?
Wilson da Costa Bueno, Diretor da Comtexto Comunicação e Pesquisa, consultoria na área de Comunicação Corporativa/ Jornalismo Especializado.