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A síndrome “Ultrafarma”: quando o CEO pisa na bola, não mais remédio e nunca fica barato!

A presença, cada vez mais frequente, dos CEOs em campanhas de propaganda/marketing de suas empresas ou organizações, tem sido saudada por estudiosos e profissionais de comunicação, sobretudo quando esta visibilidade midiática se caracteriza pela espontaneidade e por uma narrativa consistente, o que favorece a interação com os seus clientes, consumidores e funcionários.

A atuação dos CEOs como porta-vozes, ou até mesmo como garoto(as) de propaganda de suas empresas, se pautada por determinados princípios, pode, efetivamente, contribuir para a construção de uma imagem positiva das empresas, visto que os altos executivos transferem para elas os atributos do seu desempenho nas peças publicitárias.

Reportagem publicada pelo Valor, assinada por Jacilio Saraiva, no último dia 15 de agosto, reforçava esta tese, reconhecendo a relação entre a reputação institucional e a avaliação dos CEOs pelos seus públicos de interesse. Segundo João Felipe Sauerbronn, professor da FGV, citado pela matéria, “a reputação da companhia depende, em grande medida, da visão que os stakeholders têm do gestor” porque “executivos bem vistos atraem e retêm os melhores profissionais, influenciam pessoas, captam investimentos e geram vendas”.

A reportagem menciona estatísticas do Linkedin que comprovam que, nos últimos dois anos, houve um incremento importante (superior a 50%) de postagens compartilhadas por presidentes e executivos de empresas e esta condição pode ser justificada pelo reconhecimento de que a imagem dos altos executivos se constitui em um “ativo reputacional”.

Não há, necessariamente, dúvidas com respeito a este fato, mas, como adverte o ditado popular, “cuidado com o andor que o santo é de barro”. Muitos gestores de alto nível (presidentes, diretores, superintendentes), sem se dar conta (não acionam o desconfiômetro!) podem, contra a sua vontade, não conseguem aparecer bem na fita, ou seja, na mídia.

A matéria do Valor chama atenção para esse detalhe e lembra, a partir de declarações de vários CEOs, de que há alguns atributos que são essenciais para o sucesso desta presença midiática, como a fluência, a espontaneidade, coerência entre a fala e a realidade, além de uma estreita relação com a marca institucional.

Quando o executivo se coloca como porta-voz da organização que comanda, mas não tem habilidade comunicacional e, ostensivamente, se apresenta como um mero reprodutor de textos previamente elaborados, a repercussão na audiência certamente não será positiva.
Mas há casos em que a presença repetida e abusiva de um CEO pode gerar, em determinadas situações, um impacto negativo absolutamente dramático.

Identificamos esta condição com a expressão “síndrome da Ultraforma”, resgatando o fato recentemente ocorrido com principal gestor desta empresa, o sr. Sidney Oliveira, que se viu envolvido em uma investigação da Receita Federal por liderar um processo escandaloso de sonegação de impostos. Ele chegou a ser preso, foi libertado com a indicação de uma fiança expressiva (25 milhões de reais), confessou que não tinha recursos para pagá-la, e continua presente na mídia como exemplo de um gestor não íntegro. Como diz mais um ditado popular, “por fora bela viola, por dentro pão bolorento”.

Certamente, todas as vezes, a partir de agora, que contemplamos esse executivo, em cartazes gigantescos colocados à frente das suas unidades de venda (farmácias) e o vemos e ouvimos prometer, na TV, que garante um preço imbatível para os produtos que vende, vem à nossa mente a falta de sintonia entre a sua postura midiática e a integridade de caráter. Fica fácil, admite a opinião pública, vender remédio mais barato quando não se paga impostos e isso representa um caso criminoso de concorrência desleal.

A “síndrome da Ultrafarma” provoca exatamente o conflito entre narrativas midiáticas e a realidade dos fatos e essa falta de sintonia abala, de forma contundente, a reputação das organizações que têm gestores (ou donos) com esse perfil.

No caso brasileiro, há inúmeros exemplos a serem citados, como a de empresários (pai e filho da grande rede varejista Casas Bahia), acusados de aliciar adolescentes para exploração sexual dentro da própria sede da empresa; o fundador de uma companhia aérea (Gol), responsabilizado pela tentativa de assassinato de um parente e pela morte de um funcionário; um ex-dono das varejistas Mappin e Mesbla por gestão fraudulenta e por aí vai.

A exposição midiática tem o seu preço e os CEOs que se propõem a frequentar com regularidade e destaque os meios de comunicação tradicionais (rádio, TV, jornal) e as mídias sociais precisam estar cientes de que deverão, permanentemente, ser percebidos e, mais ainda, ser, efetivamente, considerados como personalidades acima de qualquer suspeita.

A “síndrome da Ultrafarma” nos ensina uma lição, que pode ser dolorosa para aqueles não entregam o que prometem: quando a imagem, as falas e as promessas de uma personalidade conflitam com o que acontece com elas na sua vida real, a crise institucional é inevitável. Como deve ter percebido o sr. Sidney Oliveira, não há remédio para a crise. E, nesses casos, “nunca fica barato”. Vai ter que pagar na Justiça, está pagando junto à opinião pública e não há desconto algum para esta fatura enorme!

Wilson da Costa Bueno, Diretor da Comtexto Comunicação e Pesquisa, consultoria na área de Comunicação Corporativa/ Jornalismo Especializado.