O Facebook vai estreitar relações com a indústria jornalística. Afinal de contas, o que nós ganharemos com isso?

O Facebook acaba de lançar um ambicioso projeto - Projeto Facebook de Jornalismo (https://br.newsroom.fb.com/news/2017/01/apresentando-projeto-facebook-para-jornalismo/) que, literalmente, pretende “estabelecer laços mais fortes entre o Facebook e a indústria jornalística.” Segundo o documento de divulgação do Projeto, o Facebook quer “colaborar com empresas de notícias para desenvolver produtos, aprender com jornalistas quais são as melhores formas para criar parcerias e vamos conversar com publishers e educadores para entender como podemos ajudar as pessoas a se tornarem leitores informados na era digital.”
A proposta do gigante do mundo digital é atuar em três frentes: 1) Colaboração no desenvolvimento de novos produtos; 2) Treinamento e Ferramentas para Jornalistas e 3) Treinamento e Ferramentas para Todos.
Para atender à primeira frente, revela que vai desenvolver “novos formatos para contar histórias, valorizar as notícias locais e partir para novos modelos de negócios. Pretende também ouvir o que ele chama de “parceiros da mídia” e utilizar os “hackatons”, ou seja, patrocinar eventos com a presença de “programadores, designers e outros profissionais ligados ao desenvolvimento de software em maratonas de trabalho com o objetivo de criar soluções específicas para um ou vários desafios.
No que diz respeito ao treinamento e ferramentas para jornalistas, ele se concentrará na capacitação das redações e oferecerá, cursos online para jornalistas sobre os produtos, as ferramentas e os serviços do Facebook, inclusive em Português. Ele promete que tornará gratuita a ferramenta Crowdtangle, que permite às editoras rastrear como seu conteúdo se espalha na web, mede a performance de matérias nas redes sociais e identifica influenciadores, e incrementará, com novas ferramentas para os jornalistas, o uso do Facebook Live.
Na última frente, que se refere especificamente aos usuários da informação, o Facebook estará (a promessa é dele!) empenhado em combater os boatos e garante que irá contribuir também para o processo de discernimento de notícias, quer dizer “é ajudar as pessoas na nossa comunidade a terem a informação que elas precisam para decidir em quais fontes podem confiar.”
O Facebook informa que, desde abril último, está colocando em execução “dois programas do Projeto Facebook para Jornalismo para apoiar veículos de comunicação na busca de novas formas de se conectar com o público. Eles estão sendo expandidos para o Brasil, como parte do investimento global de US$300 milhões da empresa em três anos para dar suporte à indústria de notícias, parceiros e produção de conteúdo” e adianta que “mais de 30 veículos brasileiros irão participar dos Aceleradores de Vídeo Digital e de Notícias Locais.”
No caso dos Aceleradores de Vídeo Digital, o “Facebook vai oferecer treinamento e palestras durante seis semanas sobre estratégias de vídeo no jornalismo digital para 20 veículos brasileiros” e para cumprir o programa de Aceleradores de Notícias Locais, a ser desenvolvido no segundo semestre deste ano, estará centrado no apoio a veículos brasileiros de notícias locais para tornar seus modelos de negócio mais sustentáveis.” Para tanto, informa que estará “trazendo representantes de 12 veículos de Estados diferentes, das cinco regiões do Brasil, para ajudá-los a encontrar e fidelizar a audiência.”
É importante que todos estejamos atentos a estas parcerias e vale a pena destacar que nem sempre a imprensa brasileira está efetivamente comprometida com o interesse público, muitas vezes dando respaldo a interesses políticos e empresariais que ferem os nossos direitos, muitas vezes sonegando ou falseando informações em favor de sua própria sustentabilidade.
A formação dos jornalistas não se resume, portanto, a mero esforço de capacitação ou treinamento (adestramento?) mas deve incluir, obrigatoriamente, uma proposta que favoreça o desenvolvimento do espírito crítico, valorize a independência editorial e busque chamar a atenção para a interferência muitas vezes espúria do poder político e econômico no trabalho da imprensa.
Talvez este projeto possa também debater a questão do jornalismo patrocinado, um modelo de negócios que pode ser até interessante para as organizações de mídia, mas bastante nefasta para a qualidade da informação jornalística.
Não sejamos radicais a ponto, de imediato, negarmos a iniciativa do Facebook, mas cautela e caldo de galinha não fazem mal para ninguém. Quando as empresas monopolistas se movimentam, pode sobrar para nós.
Wilson da Costa Bueno, Diretor da Comtexto Comunicação e Pesquisa, consultoria na área de Comunicação Corporativa/ Jornalismo Especializado.