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Os muitos desafios do jornalismo para 2023

Os últimos anos não foram fáceis para jornalistas e veículos porque, além da pandemia (perdemos muitos colegas para a Covid 19), tivemos que conviver com governantes autoritários que, dentre os seus piores atributos, exibiam preconceito (e aversão) aos profissionais de imprensa, sobretudo às mulheres que militam na área.

É razoável imaginar que este confronto permanente entre políticos e autoridades deva atenuar com o novo Governo, mas isso não significa que todas as dificuldades estarão superadas e que vamos todos “voar” em céu de brigadeiro. Muito longe disso. A polarização política e ideológica deixou raízes profundas no universo da comunicação e conviveremos por muito tempo ainda (talvez para sempre) com a desinformação, a intolerância, o não reconhecimento da importância da diversidade de ideias e opiniões, o que constitui a essência da democracia.

A prática jornalística, infelizmente, tem flertado com o poder político e econômico e, em muitos casos, substituiu a perspectiva investigativa por uma adesão acrítica à visão oficial, preferindo repetir velhos e ultrapassados pontos de vista. Incorporou, também, o negacionismo e deixou de estabelecer limites nítidos entre a informação, a verdade dos fatos, e a mera impressão a respeito de tudo. Há, portanto, muitos desafios a vencer em 2023. A pressa e o preconceito subliminarmente instalados nas redações continuarão abrindo brechas para episódios como o da cobertura do Estadão ao crime praticado por um jovem branco em escolas de Aracruz (ES) (matou professoras e uma aluna). O jornal ilustrou a notícia com uma mão negra, ferindo todos os princípios que devem contemplar uma cobertura qualificada e justa.

O jornalismo brasileiro precisa, de uma vez por todas, se libertar das fontes oficiais e incluir, obrigatoriamente, os cidadãos como protagonistas nas notícias. Chega desta “badalação” enfadonha de autoridades que, comprometidas com interesses pessoais e de grupos, manipulam as informações para ludibriar a opinião pública.

Mais do que nunca, é necessário reforçar os sistemas e mecanismos de checagem das informações para que não permaneçamos refém das fake news, que circulam intensa e ruidosamente pelas redes sociais, pautando reportagens e comentários sem qualquer vínculo com a realidade.

Urge denunciar os lobbies que estão empenhados em consolidar interesses espúrios, como os que caracterizam a indústria tabagista, agroquímica, farmacêutica, dentre outras, e ações que incentivam e legitimam o consumo não consciente, ameaçando a qualidade de vida e a sustentabilidade de maneira geral.

As assessorias de imprensa, que têm, felizmente, se profissionalizado em nosso país, atuando como parceiras valiosas das redações, devem manter esse empenho, buscando não confundir fatos reais, verdades objetivas, com meros arroubos de marketing para saudar os seus clientes e chefias.

Além disso, as pautas devem promover as políticas afirmativas, desconstruindo preconceitos de natureza social, racial, de gênero e religiosa, contribuindo para um clima saudável, inerente ao debate democrático.

A cobertura de áreas especializadas (ciência, tecnologia, meio ambiente, saúde) torna indispensável a capacitação dos jornalistas e será, cada vez mais, necessário fugir da zona de conforto para enfrentar temas complexos que exigem, por parte dos profissionais de imprensa, atualização permanente. Frequentar cursos voltados para temas emergentes, desenvolver pesquisas e diagnósticos e dialogar com fontes reconhecidamente competentes são posturas fundamentais para este novo tempo.

Os desafios não são, como podemos ver, nem poucos nem fáceis de serem vencidos, mas merecem a atenção da imprensa, se ela efetivamente deseja manter-se comprometida com a cidadania.

É preciso competência técnica, mas também coragem porque aqueles que detêm o poder não estão dispostos a negociá-lo para fazer favorecer os interesses da sociedade, porque se acostumaram a exercer o controle, a ditar as regras e a manter os seus privilégios. Está na hora de virar a mesa e equilibrar o jogo. A democracia não tem donos e a imprensa deve estar empenhada em modificar este cenário desigual e injusto. Vamos nessa?

Wilson da Costa Bueno, Diretor da Comtexto Comunicação e Pesquisa, consultoria na área de Comunicação Corporativa/ Jornalismo Especializado.